JOÃO 8:32 “E CONHECEREIS A VERDADE, E A VERDADE VOS LIBERTARÁ”
Esse texto bíblico do Evangelho de São João tem sido o mais mencionado no debate público brasileiro. Muito comum no meio cristão, o versículo tomou uma dimensão política excessiva, quase que um adágio popular, principalmente após ser adotado como o slogan de campanha do então candidato ao cargo de Presidente da República do Brasil nas eleições em 2018.
Mas você já se perguntou em que contexto Jesus Cristo proferiu essas palavras?
Bom, primeiramente vale lembrar que uma das regras básicas da hermenêutica bíblica é a interpretação do texto dentro do seu contexto. Não é bom retirar textos bíblicos sem considerar os respectivos contextos e estilos literários nos quais foram escritos. O surgimento de tantas falsas doutrinas e ensinamentos antibíblicos advém por conta de interpretações equivocadas das escrituras.
O CONTEXTO
O contexto da fala de Jesus encontra-se no episódio da mulher que foi trazida a ele sob acusação de ter sido surpreendia em flagrante adultério (João 8:1-11). Duas classes de representantes da religião judaica da época, escribas e fariseus, trouxeram aquela mulher à presença de Jesus para testá-lo, já que, para os religiosos da época, ela deveria ser sentenciada à morte por violar a lei moral de Deus.
Com objetivos político e religioso de complicar a situação de Jesus, os líderes religiosos confrontaram o mestre de Nazaré para saber qual seria o seu posicionamento exegético da Torá diante daquele caso, uma vez que a sentença de morte estava certa ao se aplicar a Lei de Moisés, pois esta impunha a pena capital por apedrejamento sobre qualquer homem ou mulher que fossem pegos em flagrante adultério:
E os escribas e fariseus trouxeram-lhe uma mulher apanhada em adultério; E, pondo-a no meio, disseram-lhe: Mestre, esta mulher foi apanhada, no próprio ato, adulterando. E na lei nos mandou Moisés que as tais sejam apedrejadas. Tu, pois, que dizes? João 8:3-5
Estava claro que o foco dos escribas e dos fariseus era tão somente tentar ao Senhor Jesus para que eles pudessem achar alguma coisa para o acusar: “Isto diziam eles, tentando-o, para que tivessem de que o acusar“. João 8:6
Porém, Jesus conhecendo a intenção maligna deles, não proferiu palavras. Apenas se inclinou e começou a escrever na terra com dedo. Mesmo assim os religiosos legalistas insistiam em obter do Senhor o seu posicionamento. Jesus, porém, não caiu na provocação dos religiosos, mas apenas indagou: “Quem de vós está sem pecado seja o primeiro a atirar a primeira pedra” (v.7). E continuou a escrever no chão.
A Bíblia narra que todos saíram, um a um, a começar pelos mais velhos. Até hoje ninguém sabe quais palavras foram escritas por Jesus naquele momento. Muitos especulam que Cristo, como profeta, talvez tenha escrito os pecados de todos aqueles religiosos que, hipocritamente, se achavam mais santos do que aquela mulher adúltera. Outros poderiam dizer que naquele episódio havia uma grande armação ou injustiça, porque deixaram de lado o homem adúltero que, segundo o texto de Levítico 20:10, deveria ser julgado junto com a mulher. No entanto, a maior lição deixada por Jesus é que ele não a acusou e nem propôs lhe tirar a vida, mas apresentou seu amor e seu perdão. Se Cristo, sendo o Filho de Deus, não condenou aquela mulher, nós também não podemos sair julgando e condenando as pessoas (Mateus 7:1).
A INTENÇÃO DOS RELIGIOSOS
Enquanto os escribas e fariseus estavam preocupados com suas posições políticas e religiosas, Jesus estava exaltando o lado espiritual, buscando refletir o amor, a compaixão e a liberdade da alma. Em outro momento, Jesus disse que “O Filho do Homem não veio para destruir as almas dos homens, mas para salvá-las” (Lucas 9:56). Por conta dessa mensagem, começou a surgir um sentimento de ódio e de muita violência por parte dos líderes religiosos da época. A religião para eles, na verdade, era somente um trampolim para se obter dinheiro e poder diante dos homens. Se você hoje busca na religião cristã esses mesmos interesses políticos e econômicos, saiba que existe uma verdade de Cristo que precisa te libertar.
O CONFRONTO DE CRISTO
Sabendo que a motivação de muitos daqueles religiosos era totalmente antagônica à sua mensagem, Jesus colocou em prova a base da fé daqueles que se aproximavam dele. Após se revelar como Filho de Deus e legítimo descendente de Abraão, a Bíblia vai dizer que muitos judeus passaram a acreditar nele. Porém, Jesus – que desvenda os corações – quis depurar a fé daqueles judeus, já que apenas o reconhecimento cognitivo da mensagem de Cristo não seria suficiente para alguém se tornar seu discípulo.
O texto de João 8:31 vai dizer que Jesus se dirigiu aos “judeus que criam nele”, afirmando que, se eles permanecessem na palavra dele, então eles iriam conhecer a verdade e a verdade os libertaria. A figura da escravidão era algo muito presente na mente dos ouvintes daquela época. Era algo muito insultante para um judeu ouvir de Jesus, um camponês, que eles eram escravos de alguém, principalmente porque eles se consideravam livres em Abraão. Porém Cristo demonstrou que não bastava ser descendente étnicos de Abraão para ser livre, ou seja, não adiantava evocar uma ascendência familiar ou até mesmo uma cultura religiosa. Para ser discípulo de Cristo, é necessário permanecer nos ensinamentos do Evangelho.
A VERDADE QUE LIBERTA
O contexto é bem claro em dizer que a verdade que liberta não é a verdade da filosofia ou da religião, mas, sim, a verdade cristalizada no Evangelho de Cristo. Os judeus se orgulhavam porque eram descendentes de Abraão, como que se uma certidão de nascimento fosse um passaporte para ser cidadão do céu. Eles se jactavam dizendo que a nacionalidade deles era a verdadeira marca de suas liberdades.
Até hoje muitos ainda acreditam que o Israel étnico é mesmo o “povo escolhido” de Deus, independente de crer ou não na pessoa de Jesus Cristo. Essa suposta superioridade não tem respaldo na boa interpretação das escrituras. Jesus, ao responder a jactância dos judeus que criam nele, trouxe à baila quais são os verdadeiros sentidos de escravidão e de liberdade. Jesus disse: “Todo aquele que comete pecado é escravo do pecado”. O Mestre usou o contexto cultural da época para ilustrar verdades eternas. A figura da escravidão ainda era tolerada naquela época. Cristo quis dizer que o escravo, diferente do filho, não faz parte da família. Aliás, este até poderia ser vendido. O Senhor afirmou que aqueles judeus eram escravos do pecado, cujo dono era Satanás, porque almejavam satisfazer a vontade do seu senhor. Somente o Messias, o Filho de Deus, poderia dar a eles a verdadeira liberdade, transformando-os em membros da família divina.
ESCRAVOS DA RELIGIOSIDADE
Jesus disse aos religiosos que eles eram escravos da letra morta da Lei. Eles não pertenciam ao Reino do Messias, cuja palavra viva se baseia no amor, na longanimidade, na compaixão, na misericórdia, no perdão e na graça. Muitos religiosos, de igual modo hoje, estão preocupados com a “letra” morta da sua religião, cujo foco é o status social, a liturgia e as benesses da fé. O mestre de Nazaré confrontou os judeus da sua época dizendo que eles, mesmo professando uma crença, eram, na verdade, filhos do diabo e buscavam satisfazer os desejos dele: matar, roubar e destruir.
Vós tendes por pai ao diabo, e quereis satisfazer os desejos de vosso pai. Ele foi homicida desde o princípio, e não se firmou na verdade, porque não há verdade nele. Quando ele profere mentira, fala do que lhe é próprio, porque é mentiroso, e pai da mentira. João 8:44
MARCAS DA VERDADEIRA LIBERDADE
As marcas da verdadeira liberdade se revelam quando refletimos o caráter de Jesus. Os escribas e fariseus fizeram uma apologia histórica dizendo que eles eram livres, simplesmente por serem descendentes de Abraão. Jesus refuta esses argumentos falhos, não porque Ele achou uma contradição em Abraão, mas porque a conduta prática dos religiosos não condizia com as verdades alusivas ao pai da fé. Jesus disse que o próprio Abraão viu o dia de Cristo e alegrou-se nele:
“Abraão, vosso pai, exultou por ver o meu dia, e viu-o, e alegrou-se”. João 8:56
Portanto, a verdadeira marca da liberdade consiste em crer na Palavra de Cristo em sua plenitude, e não apenas naquilo que me convém. Aqueles Judeus chegaram até acreditar, de forma superficial, que Jesus poderia ser o Messias. Porém queriam um messias político que viesse destruir Roma. A preocupação dos religiosos da época era implantar um reino teocrático na Terra sob a liderança do messias guerreiro, no entanto Cristo frustrou os projetos equivocados deles, ao afirmar que o Seu Reino não é desse Mundo.
Respondeu Jesus: O meu reino não é deste mundo; se o meu reino fosse deste mundo, pelejariam os meus servos, para que eu não fosse entregue aos judeus; mas agora o meu reino não é daqui. João 18:36
Hoje, a mesma verdade precisa ser pregada, ainda mais quando se usa esse versículo para fins meramente retóricos e ou políticos. A verdade que liberta é a mensagem do Evangelho de Cristo que confronta o homem com todas as suas mazelas pecaminosas. O Sistema religioso sem Deus escraviza, mas as boas novas de Cristo libertam a alma do pecador. Por isso, ainda é necessário se conhecer esta verdade para que ela, de fato, possa nos libertar.
Referência:
Todas as referências bíblicas citadas aqui ou em outros textos são retiradas da Bíblia versão Almeida Corrigida e Revisada Fiel ao Texto Original (ACF) da Sociedade Bíblica Trinitariana, a não ser que seja expressamente citada outra versão. Ela pode ser encontrada via app para celular (Bíblia Fiel) ou pelo site https://www.bibliaonline.com.br/acf.
Deus te abençoe!