Ação humana

Para que todos vejam, e saibam, e considerem, e juntamente entendam que a mão do Senhor fez isto, e o Santo de Israel o criou.

Isaías 41:20

Um dos conceitos mais fundamentais e mais esquecidos em economia é ação humana. Inclusive, é com esse conceito bem definido que conseguimos fazer economia. E é justamente com esse conceito, manipulado, que governos totalitários, autoritários e ditaduras dominam pessoas através da força estatal (que não é nosso objeto de comentários aqui) ou econômicos. E esse conceito, bem feito definido, será base para outros conceitos, como valor, preço, dinheiro e moeda. Sim, são quatro conceitos ou objetos diferentes e distintos entre si e que no nosso dia a dia intercambiamos.

Ação humana é o comportamento propositado de forma racional e consciente. Este conceito é um panorama de tudo o que temos em economia. Mises, por exemplo, gastou 1.020 páginas para discorrer este conceito no maravilhoso livro Ação humana. Rothbard, um dos alunos de Mises, tem a sua carreira acadêmica inteira e até a “criação” de um outro conceito, a partir da filosofia e da economia, com base na ação humana. Veja que este conceito, na primeira frase, já elimina o que não é ação humana e restringe, para os nossos propósitos econômicos, o que é.

Indo para o que não é ação humana. Qualquer comportamento inconsciente (eventos psicológicos), movimentos físicos (de partículas e átomos) e movimentos biológicos não intencionais / propositais / racionais / conscientes (como batimentos cardíacos) não são ações humanas dentro do contexto econômico.

Por outro lado, ação humana é uma manifestação da vontade humana que advém de um cálculo racional, consciente e com fonte em desejo de sair do desconforto onde está momentaneamente. Aqui, automaticamente, já está descartado as vontades aleatórias, como “prefiro o sol a chuva” etc. Ação humana, neste contexto que estou trabalhando, é uma execução, um trabalho efetivo, com uma finalidade e com fonte na mudança do comportamento atual e com objetivo de diminuir o desconforto.

Parece que está teórico demais, mas é isso mesmo. Ação humana vem de um campo de estudo chamado praxeologia, que é o estudo da prática, da ação. Neste contexto, a ação humana é sempre algo proposital e real, ou seja, eu executo algo com uma determinada finalidade (de diminuir desconforto). Em termos econômicos, a ação humana é o processo de produção, ou seja, saio de um ponto a outro executando processos e, no fim, terei um outro estado ou comportamento.

Outro detalhe que precisamos ter em mente são os objetivos finais. Aqui estou colocando ou intercambiando o termo desconforto no sentido econômico, e não no sentido de desejo final. Um exemplo bem esdrúxulo: estou desconfortável que pessoas estão felizes, então vou atacá-las para diminuir meu desconforto. Erradíssimo: isso não é ação humana no contexto econômico que estamos tratando aqui. A gente até pode considerar, forçadamente, que a execução em si do ataque (compra de material bélico etc) seja uma ação humana, mas é estritamente na questão econômica. Ou seja, a praxeologia trabalha com os meios, é uma ciência dos meios.

Nesse sentido, não é lógico de se dizer, dentro desse contexto econômico, que ação humana ou praxeologia é boa ou ruim em si. Um outro exemplo: a física nuclear é uma boa ciência? Essa pergunta não faz sentido: é uma ciência que estuda processos. Por outro lado, uma pessoa pode tomar a física nuclear e produzir um gerador tokamak para produção de energia elétrica; um ditador pode usar a mesma física nuclear para construção de bomba atômica. O processo de produção de energia elétrica e bomba nuclear é o mesmo, a finalidade “final” do ser humano não entra dentro da física nuclear. Nesta mesma analogia, a praxeologia ou ação humana que estamos trabalhando é o processo econômico.

Acho que está claro, até aqui, que ação humana é algo racional e consciente. E, como estamos em um contexto econômico, a ação humana é uma escolha que se faz dentre alternativas. A economia, na essência (ou na quântica econômica; termo que estou “inventando” e pretendo desenvolver), é o estudo da ação humana dado as opções disponíveis. As opções disponíveis são os meios e recursos.

Os recursos são qualquer coisa que é utilizada para transformar algo em outro algo. Por exemplo, terra, trabalho, tempo e ar são recursos. Já os recursos escassos, como já trabalhamos em duas outras colunas (EconoTeo – Economia e Teologia na mesma mercadoria e Propriedade privada) são meios (produtos ou serviços) que tem disponibilidade escassa, ou seja, finita e não tem para todos que os desejam. Ou seja, há uma quantidade de produtos e serviços disponíveis e que não são infinitos ou disponíveis para todo mundo. Exemplos são quase infinitos: água, comida, joias, produtos industrializados, serviços de forma geral (consertos de máquinas, magistério) etc.

Apenas para complementar: recursos também podem ser chamados e classificados como bens e serviços. Por exemplo, os bens de capital são recursos utilizados para fabricação de outros bens, como máquinas, fios e ferramentas. Bens de consumo é o produto final, como alimentos (bens não duráveis) e geladeira (bens duráveis). Aqui já entra uma minúcia da economia que, para nossos propósitos, não precisamos adentrar. Caso precise, apenas classificarei os termos que são encontrados nos livros.

A ação humana pode ser sintetizada em três condições gerais: desconforto, imagem de uma situação melhor e expectativa de que tal comportamento (sempre propositado) possa modificar o desconforto. Nas palavras do próprio Mises:

Estas são as condições gerais da ação humana. O homem é um ser que vive submetido a essas condições. É não apenas homo sapiens, mas também homo agens. Seres humanos que, por nascimento ou por defeitos adquiridos, são irremediavelmente incapazes de qualquer ação (no estrito senso do termo e não apenas no senso legal), praticamente não são humanos. Embora as leis e a biologia os considerem homens, faltam-lhes a característica essencial do homem. A criança recém-nascida também não é um ser agente. Ainda não percorreu o caminho desde a concepção até o pleno desenvolvimento de suas capacidades. Mas, ao final desta evolução, torna-se um ser agente.

Ação humana, Mises

Para finalizar este curto texto, um último conceito: tradeoff (ou trade-off). Este termo técnico significa escolher algo ao invés de outro. Sendo mais direto, dentro do nosso contexto, significa simplesmente escolher algo dado as opções ou recursos disponíveis. Como estamos tratando de ação humana e ela é sempre racional, consciente, então toda escolha vai ser para diminuir o desconforto (economia). E para a diminuição desse desconforto, fazemos um cálculo mental. Nesse cálculo, descartamos algumas coisas e tomamos outras: tradeoff.

Tem muito mais temas e conceitos relacionados a ação humana. Aliás, é desse conceito que procede toda a economia. Apenas para frisar o conceito e não deixar dúvidas, finalizo com Mises que sintetiza o que não é ação humana e complementa perfeitamente com o que quis trabalhar aqui:

Ação humana é necessariamente sempre racional. O termo “ação racional” é, portanto, pleonástico e, como tal deve ser rejeitado. Quando aplicados aos objetivos finais da ação, os termos racional e irracional são inadequados e sem sentido. O objetivo final da ação é sempre a satisfação de algum desejo do agente homem. Uma vez que ninguém tem condições de substituir os julgamentos de valor de um indivíduo pelo seu próprio julgamento, é inútil fazer julgamentos dos objetivos e das vontades de outras pessoas.

Ação humana, Mises

Ficou em dúvida, quer perguntar algo ou fazer alguma crítica / sugestão? Deixe nos comentários abaixo e terei o prazer em te responder aqui ou em algum artigo específico.

Sugestão de leitura

  • Bíblia versão Almeida Corrigida e Revisada Fiel ao Texto Original (ACF) da Sociedade Bíblica Trinitariana Ela pode ser encontrada via app para celular (Bíblia Fiel) ou pelo site https://www.bibliaonline.com.br/acf;
  • Ação humana: um tratado de economia, por Ludwig von Mises. Você encontra esta obra gratuitamente no site https://www.mises.org.br/Ebook.aspx?id=44;
  • O essencial von Mises, por Murray Rothbard. Disponível gratuitamente no site https://mises.org.br/Ebook.aspx?id=162;
  • Dez lições fundamentais de economia austríaca, por Ubiratan Iorio. Disponível gratuitamente no site https://www.mises.org.br/Ebook.aspx?id=103;
  • Introdução à economia, por N. Gregory Mankiw. Editora Cengage Learning. É um livro texto de economia, mas muito bom. Tem disponível em inglês, espanhol e, claro, em português;
  • Introdução à economia, por Paul Krugman e Robin Wells. Editora Elsevier. É um livro texto de economia, muito bom.
Ludwig von Mises
Dr. Alexandre Fernandes

Até a próxima!

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