Mecânica ondulatória e o Logos divino

No princípio era o Verbo, e o Verbo estava com Deus, e o Verbo era Deus. Ele estava no princípio com Deus. Todas as coisas foram feitas por ele, e sem ele nada do que foi feito se fez. Nele estava a vida, e a vida era a luz dos homens. E a luz resplandece nas trevas, e as trevas não a compreenderam.

João 1:1-5

A coluna de hoje abordará uma das áreas fundamentais da física: a ondulatória. À primeira vista, pode parecer um tema banal ou simplista demais, mas quando se trata de equações e modelagem de fenômenos físicos, especialmente aqueles cujos mecanismos não compreendemos completamente, a ondulatória é a primeira abordagem a ser aplicada.

Por exemplo, na área da geofísica, um dos grandes interesses é compreender o funcionamento dos terremotos. Para começar, escrevemos equações que relacionam as placas tectônicas e a velocidade das ondas internas da Terra. Essas equações são baseadas em funções periódicas que aprendemos na escola, como o seno, o cosseno e a tangente. A mecânica ondulatória tem o seu início de desenvolvimento justamente na observância desse tipo de periodicidade.

Em termos mais claros, qualquer fenômeno que envolve movimento repetitivo pode ser modelado como uma onda. Não se limite a pensar apenas nas ondas do mar: temos ondas geradas pela vibração das cordas de um violão, pelo pistão de um motor de carro, pelo som, por pêndulos (como o de um relógio ou um balanço), pelo clima (massas de ar), por terremotos e pelo plasma (o Sol, por exemplo, é uma grande “bola de plasma” com ondas sísmicas). Até mesmo o início do universo está relacionado a ondas, como os BAOs: oscilações acústicas de bárions, que são grandes regiões de distribuição não periódica de matéria e que, no futuro, formariam estruturas como galáxias e aglomerados de galáxias.

Não vou escrever equações aqui, mas gostaria que você visualizasse o que vou apresentar. Você pode pegar qualquer livro do ensino médio que aborde a ondulatória, ou o livro do Young e Freedman que utilizo como base aqui (está na sessão de Sugestão de leitura) para ver as equações. Para ajudar na visualização observe a imagem abaixo:


Arquivo pessoal

A imagem acima, gerada pelo programa Geogebra (https://www.geogebra.org/calculator), mostra como é o gráfico das funções seno (verde) e cosseno (vermelho). Veja que as ondas ou as funções se repetem periodicamente e eternamente, tanto para valores positivos (em x) como para valores negativos (em x).

Agora, observe a imagem abaixo:



Veja que há uma semelhança muito interessante entre essa imagem acima e as funções seno / cosseno. A imagem acima é de um eletrocardiograma, ou seja, representa ondas eletromagnéticas emitidas pelo coração. E as semelhanças entre as funções trigonométricas e a natureza se estendem a todos os fenômenos mencionados anteriormente, e outros que você possa imaginar. Basta que esses fenômenos possuam alguma similaridade matemática com a trigonometria, por menor que seja.

Vamos caracterizar uma onda:

  • Amplitude (A): é a distância entre o eixo x e o ponto de cima ou de baixo. No caso de um som, a amplitude é o volume ou à intensidade da música;
  • Comprimento de onda (C): é a distância entre duas cristas ou dois vales consecutivos. Essa medida marca a periodicidade da onda, mas não significa que os tamanhos sejam sempre iguais ao longo do tempo. Por exemplo, um batimento cardíaco pode ter um comprimento de onda menor ou maior em determinado período de tempo;
  • Período(T): é o tempo necessário para que uma onda complete um ciclo ou um comprimento de onda completo. É o intervalo de tempo entre duas cristas ou dois vales consecutivos;
  • Frequência (f): é a quantidade de ciclos ou ondas que ocorrem em um segundo e é medida em hertz (Hz). Por exemplo, uma onda com frequência de 3 Hz oscila três vezes em um segundo. O ouvido humano é capaz de perceber sons que estão na faixa de frequência entre 20 Hz (sons graves) e 20 kHz (ou 20.000 Hz, sons agudos), em linhas gerais;
  • Velocidade (v): é a velocidade com que a onda se propaga. Por exemplo, a velocidade do som no ar é de aproximadamente 343 m/s ou 1.224 km/h.

Arquivo pessoal

Além dessas características, que são universais, as ondas podem ser divididas em tipo mecânica e tipo não mecânica. As ondas mecânicas precisam de um meio físico para se propagaram. Exemplos clássicos são as ondas sonoras ou som e as ondas do mar. O meio por onde o som se propaga é o ar: eu falar significa que as minhas cordas vocálicas vibram o ar ao redor delas e, essa vibração no ar é transmitida para a próxima camada de ar até o ar ao redor do seu tímpano (dentro o seu ouvido) vibrar na mesma frequência. Dentro da sua cabeça há uma tradução da vibração do seu tímpano em pulsos elétricos (ondas eletromagnéticas) e o seu cérebro “ouve” o som. O mecanismo é semelhante a uma caixa de som ou um fone de ouvido.


Mas há um tipo de onda que não precisa de um meio para se propagar: ondas eletromagnéticas. Essas ondas não são mecânicas, ou seja, não precisam de um meio para se propagar, como o ar, um sólido ou a água. A luz, onda eletromagnética, se propaga no espaço vazio, no vácuo, atravessa o universo. Falaremos sobre ondas eletromagnéticas em um outro texto onde exploraremos esses detalhes e o eletromagnetismo, juntos.

Ainda sobre ondas mecânicas ou ondas que precisam de um meio para se propagar, é fácil entender que a propagação dependerá das características físicas desse meio, como densidade (massa e volume), temperatura e pressão. Veja a tabela abaixo para você ter uma ideia da velocidade do som em alguns materiais:


Fonte: livro Física II – Termodinâmica e ondas, por Young & Freedman, Sears & Zemansky, 14 ed, pág. 161

Todo esse conhecimento físico é necessário para entendermos o básico sobre muitas coisas do nosso cotidiano. Por exemplo, exames clínicos que fazemos do coração, imageamentos (ressonância magnética, PET-Scan etc), do cérebro, leitura de um velocímetro de carro ou até mesmo apreciar uma música (esta tem um som mais agradável do que aquela) são interpretados, por nós, a partir do nosso conhecimento (intuitivo ou mais aprofundado) de mecânica ondulatória.

Um exemplo mais particular. Eu não gosto de sons altos porque me causam desconforto acústico. Gosto de sons mais baixos ou “ambientes”, com uma boa música. Boa música, para mim, é um som que tem misturas harmoniosas de frequências (agudas e graves) vindo de instrumentos diferentes, como a obra Der Ring des Nibelungen (O Anel do Nibelungo), de Wagner. Esta obra, uma composição de 4 óperas, tem uma belíssima junção de sons, uma verdadeira beleza musical, sem contar, claro, com a história épica que é contada através da música.

Por último, todos esses conceitos e características sobre ondas será essencial para entendermos sobre onda eletromagnética. Escrevi uma coluna, introdutória, sobre o espectro eletromagnético, mas ainda explorarei um pouco mais esses detalhes, agora com eletromagnetismo e daqui com ondas. A importância da onda eletromagnética é quase infinita: é com ela que nossos olhos veem o mundo (apesar das cores não existirem, fisicamente falando) e o nosso universo se apresenta a nós através dos telescópios com imagens e todo tipo de radiação (que é luz, que é onda eletromagnética). Fora que toda as artes plásticas, esculturas, pinturas e literatura têm, como ponto de partida, a onda eletromagnética / luz / radiação.

Um último detalhe sobre ondas sonoras. No mundo antigo, a ideia de palavra, vocalizar o som, é tão forte que as divindades têm essa característica a ponto de ser usada como criação do mundo. Isso é bem descrito até na literatura, como no Silmarillion (J. R. R. Tolkin). E é claro que temos, (nós, cristãos), no nosso mito de criação descrito em Gênesis, a forma como Deus cria o mundo: falando. A ideia é a mesma do Antigo Oriente Próximo ou das Crônicas de Nárnia: a vocalização tem poder, através da divindade, de criar o mundo físico.

E essa ideia sobe de nível até chegar ao ponto dos próprios gregos utilizarem a expressão logos como a essência da “atividade falada”, ou seja, a ideia de logos transcendeu o conceito que, lá no passado, tinha de falar, emitir som, ao “subir” para as divindades. No Novo Testamento, na Revelação do Deus pessoal, o termo logos é atualizado, no sentido de ressignificação, para Logos, ou seja, a ação do próprio Deus não apenas em algo verbal (ondas sonoras), mas a própria essência de Deus se tornando homem, com natureza humana.

E o Verbo se fez carne, e habitou entre nós, e vimos a sua glória, como a glória do unigênito do Pai, cheio de graça e de verdade.

João 1:14

Ficou em dúvida, quer perguntar algo ou fazer alguma crítica / sugestão? Deixe nos comentários abaixo e terei o prazer em te responder aqui ou em algum artigo específico.

Sugestão de leitura

  • Para esse texto utilizei o livro, para o ensino superior, Física III – Eletromagnetismo, por Young & Freedman, Sears & Zemansky, 14 ed;
  • Em qualquer livro de física e matemática do ensino médio, você encontrará sobre eletromagnetismo e trigonometria. Caso você não tenha qualquer livro em casa (mesmo o que os livros antigos; física não se desatualiza) recomendo o site para ver sobre eletromagnetismo: https://www.sofisica.com.br/conteudos/Eletromagnetismo/Eletrostatica/cargas.php. Nessa página, especificamente, começa o assunto sobre eletromagnetismo e indo no botão Próxima poderá navegar nos outros conteúdos relacionados.
Dr. Alexandre Fernandes

Até a próxima!

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