Cosmologia: o que são estrelas
Conta o número das estrelas, chama-as a todas pelos seus nomes.
Salmos 147:4
A coluna de hoje é uma espécie de conectivo com a primeira coluna do ano de 2021: constelações. Lá trabalhei conceitos muito simples e bastante práticos com relação a observação normal e natural de uma noite sem nuvens. Aliás, a primeira coisa que observamos durante o dia ou durante a noite (sem nuvens ou minimamente limpa) são as estrelas: o nosso Sol e os vários pontinhos, que cintilam, tem cores e fazem movimento estilo pisca-pisca. Ah, e se movem: se você observar, durante alguns minutos ou horas numa noite, há um movimento de todo o céu, do leste ao oeste. Inclusive, a nossa estrela, o Sol, faz o mesmo movimento todos os dias, na mesma direção e sentido.
Vamos começar do começo, de forma muito simples. Estrela, de forma geral (incluindo o Sol) é um grande corpo celeste que tem em sua constituição diversos elementos químicos da tabela periódica. Se for uma estrela jovem ou de meia idade (como é o Sol), os compostos químicos são, em grande maioria, hidrogênio e hélio. Já estrelas mais velhas, no fim da vida ou que “já morreram”, tem percentuais maiores de elementos químicos mais pesados, como carbono e ferro.
Com relação a tamanho, geralmente “medimos” as estrelas pela sua massa ou, como fazemos na Terra, pelo seu “peso”. Na realidade, quando subimos em uma balança, estamos medindo a força gravitacional que a Terra está fazendo com o nosso corpo. O aparelho balança faz uma conta, interna, e te mostra a sua massa (descontando a força gravitacional). Por exemplo, a minha balança me disse que estou com 68 kg: isso é a minha massa. Esse valor é o mesmo em qualquer lugar do universo. Agora, se eu for em Marte, com essa mesma balança, o valor será de aproximadamente 22 kg. O que está errado? É que a gravidade em Marte um terço da daqui da Terra: então, para eu saber minha massa exata (que é de 68 kg), devo usar uma balança marciana. Com as estrelas é a mesma coisa, só que não temos uma balança cósmica: medimos a sua massa por outros métodos.
Já dá para imaginar que uma estrela tem uma massa muito grande. Por exemplo, a massa do Sol é 1,989×1030 kg: 1.989.000.000.000.000.000.000.000.000.000 kg. Isso é um número muito grande, tanto para falar quanto para escrever. Mesmo escrevendo em notação científica (1,989×1030), ainda é chato. Então, dentro da astronomia criamos a unidade de massa solar: 1 massa solar = 1,989×1030 kg. Já facilita muito, por exemplo, ao dizermos que a massa da estrela Sirius (a estrela mais brilhante que você conseguir observar a olho nu durante a noite) é de 2,06 massas ou que a nossa galáxia tem uma massa, estimada, de 400 bilhões de massas solares.
As distâncias, da mesma forma, são gigantescas. Mas, também para facilitar e não usarmos notação científica ou números gigantescos, usamos 2 unidades. Uma delas é para distâncias um pouco “menores”, que é a UA (unidade astronômica): 1 UA é a distância entre a Terra e o Sol, que arredondamos para 150 milhões de km. Por exemplo, ao invés de dizermos que a distância do Sol a Saturno é de 1,429 bilhão de km, simplesmente dizemos que do Sol a Saturno tem 9,53 UA.
A outra unidade, muito conhecida, está relacionada com a velocidade da luz, que é de (arredondando) 300 mil km/s (por segundo e não por hora). Ou seja, em 1 segundo a luz dá 7,5 voltas ao redor da Terra. Então, podemos trabalhar com segundo-luz, minuto-luz, hora-luz, dia-luz ou ano-luz. Esta última é a mais usada: 1 ano-luz é equivalente a uma distância de 9,46 trilhões de km. A distância da Terra a estrela Próxima Centauri (sistema planetário mais perto daqui) é de 4,2 anos-luz, ou seja, se eu sair daqui, agora, para esse sistema andando na velocidade da luz, chegarei lá no ano 2025: são quase 40 trilhões de km.
As formas ou agrupamentos de estrelas que podemos ver no céu já explorei na coluna sobre constelações. O próximo passo a se entender sobre estrelas é como elas funcionam ou qual a diferença de uma estrela para um planeta. E a principal diferença é que estrelas fazem processos de fusão nuclear, fenômeno completamente diferente da fissão nuclear. Planetas ou satélites naturais, como a Lua, não tem processos nucleares naturais.
Fissão nuclear é quando o núcleo de um átomo (composto, basicamente, por prótons e nêutrons), é rachado pela colisão de alguma partícula (como nêutron) vindo de fora. Por exemplo, o urânio 235 (235 é a massa atômica, que é a soma dos prótons e dos nêutrons no núcleo do urânio) recebe 1 nêutron e se quebra em Bário 139, Criptônio 95, emitindo 3 nêutrons e liberando muita energia (fótons, que é radiação). Temos fissão nuclear em bombas atômicas, em ignição para bombas de hidrogênio (que é uma arma de fusão nuclear) e em reatores de usinas termonucleares.
Já a fusão nuclear é o processo inverso: há uma fusão dos elementos químicos. Por exemplo, funde-se o trítio (um tipo de hidrogênio, que tem 2 nêutrons) com o deutério (outro tipo de hidrogênio com apenas 1 nêutron). No processo, é formado o átomo de hélio (2 prótons e 2 nêutrons) com a emissão de 1 nêutron e liberação de muita energia (fótons, radiação). Encontramos fusão nuclear em pesquisas para produção de energia (como os Tokamaks) e em explosões de bombas de hidrogênio.
O que acontece nas estrelas é fusão nuclear: há fusões de hidrogênio, hélio e outros elementos químicos. E isso continua acontecendo (fusão de elementos) até chegar no ferro: olhando a tabela periódica a contagem de produção de elementos químicos é muito grande, mas nem todos são produzidos lá, por exemplo o zinco. E aí é que ocorre outra mágica.
A vida de uma estrela depende intimamente de sua massa: quanto maior a massa de uma estrela, menor é o seu tempo de vida. Isso acontece porque durante esse período há muita fusão nuclear, emissão de energia (que é o brilho da estrela: o Sol emite luz por causa da fusão nuclear) até ocorrer a morte da estrela. E a morte de uma estrela tem vários cenários possíveis.
Hoje não falarei sobre esses processos de evolução e morte de estrelas porque o assunto é vasto; em um outro momento detalharei, de forma bem simples, a você. Apenas tenha em mente que, uma das formas de uma estrela morrer é explodindo (evento de supernova): as camadas (que são feitas por elementos químicos) exteriores caem para o centro da estrela e as interiores sobem em direção para fora da estrela. Nesse meio de caminho, extremamente violento, ocorrem fusões nucleares. Depois, há uma “explosão” de tudo: como se fosse uma bomba e restos de poeira, todos os elementos químicos são espalhados para a galáxia. Esses restos mortais da estrela vão preencher grandes espaços e se juntar a outros gases e poeira. Em algum lugar da galáxia, esse material se aglutinará para formar outra estrela e o resto, planetas: é assim que nasce um sistema solar como o nosso.
Há muito mais história a ser contada sobre estrelas, mas fecharei por aqui, apenas na definição de estrela: um grande corpo celeste que executa fusão nuclear e, com isso, produzindo (literalmente criando) elementos químicos e emitindo luz. E, da morte de estrelas (supernova) temos toda a tabela periódica de elementos químicos naturais sendo produzida.
Como dizia Carl Sagan (e está corretíssimo nesse ponto), somos (nós, humanos) poeira das estrelas. Mas, vou dar uma ajeitada nessa frase para ficar mais completa: Deus nos criou a partir da poeira das estrelas. Apesar de não ter conotação científica e nenhuma relação estelar, fecharei com o texto narrativo mítico-poético da criação do homem, pois sempre lembro desse verso quando penso em morte de estrelas:
E formou o Senhor Deus o homem do pó da terra, e soprou em suas narinas o fôlego da vida; e o homem foi feito alma vivente.
Gênesis 2:7
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Sugestão de leitura
- Participei do Destaques ABC² onde falei um pouco sobre os Tokamaks com o Victor Fontana: https://www.youtube.com/watch?v=C2LQ0_dvkoo;
- O melhor material, em português, no assunto entre ciência e fé cristã é o Dicionário de cristianismo e ciência, editora Thomas Nelson Brasil em parceria com a Associação Brasileira de Cristãos na Ciência;
- Fiz mestrado e doutorado na área de cosmologia quântica. Minha dissertação e tese tem capítulo específico sobre física quântica. Também escrevi um livro, fruto da dissertação. O título da dissertação é Cosmologia quântica na gravidade teleparalela, o da tese é Discretização da energia no universo primordial e o do livro é Cosmologia quântica na gravidade teleparalela: Proposta de soluções;
- Livro Astronomia e astrofísica, por S. O. Kepler e Maria de Fátima Saraiva. Este livro é disponibilizado no próprio site dos autores, que são professores da UFRGS. É um excelente material de consulta: http://astro.if.ufrgs.br/livro.pdf;
- Livro Alfa e Ômega: a busca pelo início e fim do universo, por Charles Seife, editora Roccomn. É um livro de 2007, está um pouquinho desatualizado com relação a dados (como bóson de Higgs e ondas gravitacionais), mas ainda é muito proveitoso e com uma didática muito boa;
- Livro Cosmologia física: do micro ao macro cosmos e vice-versa, por Jorge Horvath, German Lugones, Marcelo porto, Sergio Scarano e Ramachrisna Teixeira, editora Livraria da Física. Outro livro muito bom, um pouquinho técnico, mas nada que não possa ser resolvido por si mesmo. Está um pouquinho desatualizado com relação a dados por ser de 2011, porém, altamente recomendado.